Muito se tem falado sobre as redes sociais e sua influência no estilo de vida moderno. Também encontramos diversos artigos e pesquisas explorando a interferência desses meios nos jovens e nas relações estabelecidas entre eles. O bullying, o anonimato virtual, a o vício pela net são alguns dos temas que já lemos. Como, porém, as redes sociais estão interferindo na formação da identidade dos nossos jovens?
Erik Erikson, psicanalista alemão naturalizado americano e nascido no início do século XX, estudou profundamente o desenvolvimento humano. Erikson é conhecido por criticar a psicanálise por, segundo ele, não considerar o meio ambiente e as relações sociais na formação da identidade. Este psicanalista ampliou a teoria freudiana ao tirar o foco da sexualidade e colocar nas relações sociais. Segundo sua concepção, o indivíduo cresce a partir das exigências internas de seu ego e também das exigências do meio em que vive. Cultura e sociedade são fundamentais. A energia ativadora do comportamento humano é de natureza biopsicossocial, para Erikson.
Ainda segundo ele, o Ciclo da Vida é composto por 8 estágios, cada qual marcado por um conflito e cuja superação indica a saudável evolução do ser. Dos 12 aos 20 anos, a ambivalência se faz entre Identidade e Confusão de Papéis. Nesta fase, a maior preocupação do ser humano é encontrar um papel social e há uma hipervalorização da opinião alheia. Sentimentos de vazio, isolamento e ansiedade são comuns. A busca por algo mais em meio a crises, indecisões e conflitos, além da constante projeção de tendências pessoais em outras pessoas, são características dessa fase, segundo a teoria eriksoniana do desenvolvimento humano.
Por que escolhi citar Erik Erikson, em meio a tantos pesquisadores do desenvolvimento humano? Em primeiro lugar, porque eu, pessoalmente, compartilho de suas concepções. Em segundo, pela importância que esse autor dá às relações sociais no processo de formação de identidade do ser humano. O que ele diria das redes sociais?
Em que sentido as relações sociais atuais, mediadas pelas relações virtuais, interferem na formação da identidade de um jovem? A resposta não é direta nem precisa. Nem me proponho a respondê-la integralmente neste artigo. Mas podemos fazer algumas reflexões acerca dela. Vamos lá?
A Formação da Identidade nas redes sociais
Não podemos negar que as relações virtuais estabelecidas com tamanho vigor entre nós no mundo moderno ponham em xeque as formas tradicionais de construção da identidade e as formas de representação do jovem. Por um lado, elas ampliam as dimensões locais, territoriais e globais e, com isso, ampliam as possibilidades de representação de si mesmo. Isso significa que, um jovem brasileiro, pode identificar-se com possibilidades de ser de qualquer lugar do mundo, e aproximar-se (mesmo que não fisicamente) delas. Por exemplo, ele pode desejar estudar numa universidade americana e então se empenhar, seguindo os modelos daquele país, para se tornar um aluno lá. Ou, ele pode também, ser recrutado por um grupo extremista do Estado Islâmico, a milhares de quilômetros dele. Ele pode o mundo!
As redes sociais constituem, também, terreno fértil e democrático para expressão de ideias, emoções e desejos de forma dinâmica. Podemos questionar a qualidade dessa troca de ideias e opiniões virtuais (frequentemente parece mais uma exposição do que uma troca), mas não podemos negar que a possibilidade exista. A identidade dos jovens atuais, neste sentido, se configura sob uma perspectiva de autonomia, enquanto sujeitos de comunicação, escolha, criatividade e ação.
Porém, como será que aqueles sentimentos citados por Erikson (isolamento, busca de papel social, indecisão, hipervalorização da opinião alheia) são vivenciados em meio a essas relações sociais? Alguns deles, como o isolamento, o vazio e a hipervalorização da opinião alheia podem ser muito intensificados. O vazio, a ansiedade e o isolamento são cada vez maiores pois o contato real vem sendo reduzido. E a opinião alheia significa a opinião de cada vez mais gente. Imagine só...
E como fica a Escolha Profissional nas redes Sociais?
Já mencionei em outros artigos o fato de nossa escolha profissional ser baseada em idealizações que fazemos das profissões. Construímos imagens acerca das carreiras e, a menos que tenhamos muito autoconhecimento e nos dediquemos profundamente a compreender os motivos que nos aproximam ou afastam das profissões, corremos o risco de fazer escolhas baseadas em critérios superficiais.
As mensagens transmitidas pelas redes sociais, por sua vez, tem 3 características que interferem nesse contexto da escolha da carreira. Elas reforçam a tendência natural do jovem de generalizar (“todo mundo faz isso”; “ninguém gosta daquilo”), elas divulgam apenas o lado positivo de qualquer opção de vida (todos são felizes no Facebook, certo?) e reforçam estereótipos em função das duas primeiras características. Assim, as redes sociais maquiam ainda mais as profissões, interferindo negativamente no processo de escolha de um jovem.
Se ele já tende a idealizar, isso é acentuado pelas imagens transmitidas pelas redes. As belíssimas fotos de insetos, animais e paisagens postadas pelo professor de biologia no Instagram fazem a carreira do biólogo parecer uma eterna aventura; os relatos do primo advogado no Facebook, no qual ele é sempre aclamado por clientes, fazem a advocacia parecer um eterno sucesso. E por aí vai… É preciso muito cuidado, e muita orientação ao jovem nesse momento e mais ainda nesse contexto.
Para finalizar, destaco outro ponto, também mencionado por Erik Erikson 100 anos atrás: a hipervalorização da opinião alheia. O que mais se tem (e ao mesmo tempo menos se tem) nas redes sociais é a opinião alheia. Todo mundo fala muito sobre todo mundo, curte-se muito, compartilha-se qualquer coisa, divulga-se o que temos certeza e o que não fazemos a menor ideia. Por outro lado, essa troca toda é superficial e não se tem, com ela, a dimensão real do que pensam e como agem nossos amigos virtuais. Parece que sim, ledo engano.
Assim, um pré-vestibulando que acredite ter, através das suas relações virtuais, dimensão daquilo que esperam dele e daquilo que é valorizado por seus amigos e familiares, pode estar enormemente equivocado. E, ao priorizar a comunicação pelas redes, ele abre mão da comunicação real, aquela que lhe permitiria ter uma percepção mais acertada daquilo que esperam dele, daquilo que pensam seus avós, tios, professores e demais pessoas afetivamente próximas a ele.
Vi, recentemente, posts no Facebook de vários vestibulandos com o seguinte questionamento: “O que você acha que eu devo prestar?”. A ideia, à primeira vista, pareceu-me interessante. Pensei nela como uma investigação da imagem pessoal. Por meio dessa pergunta, é como se o jovem estivesse perguntando aos amigos virtuais qual é a cara que ele tem. Porém, depois de um pouco mais de reflexão, veio a preocupação: as respostas dirão respeito à cara desse jovem no mundo virtual, e ele vai usar as respostas para tomar uma decisão no mundo real. Ai…
A reflexão não se esgota por aqui, mas, mais uma vez, fica evidente que é preciso muito cuidado e muita orientação ao jovem nesse momento e nesse contexto.