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  • Sandra Lesbaupin

Qual é a diferença entre Orientação Profissional e Vocacional?


Pai (ou mãe) para um orientador profissional:

- Você pode ajudar minha filha a decidir o que prestar no vestibular? Ela tem até o fim do mês para fazer a inscrição.

- Claro - respondo eu - Posso ajudá-la. Mas, dependendo do grau de dúvida da sua filha, ela não chegará a nenhuma conclusão num prazo tão curto.

Não. Não é essa a resposta que o pai espera receber. Afinal de contas, ele está disposto a pagar por essa informação - que eu não tenho nem nunca terei, diga-se de passagem. O que ele quer, é que eu aplique na sua filha um teste vocacional super hiper ultra moderno, validado com milhares de sujeitos, cujo resultado indique com precisão qual é a carreira que a jovem deve seguir com garantia de sucesso e felicidade eternas.

Fácil, né? Eu sou uma profissional experiente. Eu deveria ser capaz de garantir isso, certo?

O Teste Vocacional não existe

Somos indivíduos idiossincráticos, com as mais diversas características dispostas em combinações infinitas. Identificá-las, avaliá-las e interpretá-las com o objetivo de auxiliar pessoas na escolha de uma carreira é tarefa desafiadora. Requer, acima de tudo, dedicação, sensibilidade e conhecimento técnico do profissional orientador.

O Teste Vocacional nada mais é do que um jargão popular, um termo associado a uma ideia de avaliação salvadora, responsável por indicar caminhos de sucesso e, claro, a culpada nos casos de fracasso. Seria muito bom se ele existisse, inclusive para outras áreas da vida também… Já imaginou? O Teste Conjugal indicaria a pessoa certa para casarmos, aquela com a qual seríamos felizes para sempre; o Teste Paternal traria como resultado o momento exato de vida para você ter filhos sem prejudicar a carreira ou outros projetos pessoais; e assim por diante…

Historicamente, o campo da Orientação Vocacional é marcado pelo caráter conservador: um sujeito que orienta e outro que é orientado. Assim, a ideia de teste vocacional está impregnada na mente das pessoas.

A prática da Orientação Profissional realmente partiu de um trabalho metodológico, no qual se utilizavam testes de aptidões. Foi só no final da década de 70 que o psicólogo Rodolfo Bohoslavsky (1977) questionou os princípios que até então determinavam as concepções nesta área e propôs um trabalho denominado por ele de “Clínico”, no qual busca-se dar condições para o jovem ressignificar sua realidade. Este terapeuta revolucionou a orientação vocacional ao criticar o modelo estatístico de orientação, segundo o qual a adolescência é um momento de crises e portanto não há espaço para um trabalho de reflexão por parte dos jovens. A proposta do modelo estatístico era, exatamente, o uso de testes que visam aproximar os sujeitos (com interesses e habilidades inatas, porém ainda não “descobertas”), das profissões que requerem aptidões específicas.

A partir de então, pouco a pouco, cada vez mais os profissionais da área passaram a entender este trabalho não mais como uma orientação vocacional. Muitos ainda denominam o trabalho que fazem de Orientação Vocacional (mesmo não sendo!) e com isso alimentam expectativas infundadas em seus clientes. Segundo meu colega de profissão, Ricardo Lima, “desconstruir o Teste Vocacional é, por vezes, mais trabalhoso do que todo o restante do processo”.

O Perfil Vocacional de um indivíduo é profundo e complexo. Não há instrumento, máquina, aplicativo, software ou mecanismo capaz de diagnosticar de forma precisa, fidedigna e válida algo tão amplo.

Porém, para além desse perfil vocacional, há também inúmeros outros fatores do ser humano que interferem nesse conjunto e não permitem que a orientação profissional uma ciência exata, breve e com garantias.

OP X OV

Nesse sentido, acredito na escolha do curso universitário a partir de um processo informação e autoconhecimento. Chamo este trabalho de Orientação Profissional pois implica na escolha ativa do sujeito por uma profissão. Esta escolha é tão melhor quanto melhor for a compreensão que o sujeito tem de si mesmo e das suas crenças, dos seus valores, das suas forças e fraquezas. Quais são os fatores que o influenciam? Quais são suas expectativas e desejos para o futuro? O que o mercado de trabalho atual oferece de opções?

A Orientação Profissional, da maneira como eu a concebo, trabalha com a identificação do sujeito no contexto global. Acredito em múltiplas possibilidades, não em uma única.

A Orientação Vocacional, por sua vez, faz menção à vocação e sugere algo que o sujeito nasce com habilidade extrema para fazer e cuja identificação é o único caminho para sua felicidade. Não. O que nós, psicólogos, fazemos, é Orientação Profissional. Vamos afinar os termos de uma vez por todas?


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